É possível ser mais humano? E menos? Embora todos nós sejamos humanos, não é incomum ouvir expressões como “essa pessoa é muito humana” ou, por outro lado, identificar determinadas atitudes ou situações como “desumanas”, mostrando que de alguma forma percebemos gradações nessa forma de ser. Desumanizar-se (agir como um robô sem sentimentos) e desumanizar os outros, na verdade, é mais fácil do que imaginamos, e infelizmente não faltam exemplos disso na história e no cotidiano.
Ao mesmo tempo, é possível cultivar de forma consciente nossa humanidade, de maneira a nos tornarmos pessoas melhores, e essa é a proposta do Grupo de Estudos de Humanidades, Saúde e Infância, um encontro semanal que vem acontecendo há mais de uma década na Fundação e que une dois valores muito caros a ela: o humanismo e o conhecimento.
O otimismo de um humanista realista. A criação Grupo de Humanidades foi uma iniciativa do nosso instituidor, o Dr. José Luiz Setúbal, por acreditar que uma forma muito poderosa de trazer as humanidades para o espaço de cuidado seria promovendo discussões sobre o assunto, onde as pessoas poderiam refletir e compartilhar suas ideias e pontos de vista. Porém, ao apresentar a ideia ao professor Adriano Bechara, que vem conduzindo os encontros desde então, ele tentou limitar as expectativas dizendo que “Olha, isso é uma iniciativa minha, pessoal, e eu acho bem provável que tenha uma aceitação baixa. Eu não criaria expectativas. Esse grupo talvez tenha três, quatro pessoas, porque não vai gerar currículo, não vai gerar pontos na carteira... Mas eu tenho interesse em tentar”. E assim começou.
Mas o que seria isso de discutir Humanidades? Os encontros conduzidos pelo prof. Adriano Bechara giram em torno de obras que são expressões da humanidade, como textos literários ou teóricos, filmes, músicas ou pinturas, com as quais os participantes se confrontam e podem dizer o que percebem. São discutidos desde autores como Santo Agostinho, Grada Kilomba e Davi Kopenawa a músicas de Chico Buarque e curtas-metragens como “The neighbors' window”, de Marshall Curry.
Mais de dez anos se passaram desde então e a iniciativa não apenas se manteve por todo esse período (inclusive durante a pandemia, quando começou a ser realizada de forma on-line) como formou-se mais uma turma em outro horário, além de ter desdobrado para outra iniciativa, os Diálogos de Bioética (sobre isso falaremos quando o assunto for “Ética”). Conforme previsto pelo Dr. José Luiz, os grupos não são grandes, mas seus membros são fiéis, e assim como tudo na vida, às vezes saem algumas pessoas enquanto novas chegam, e a proposta continua à disposição de todos aqueles que estiverem dispostos ao encontro – com outras pessoas, com ideias, com obras que são expressões da humanidade.
O que ganhamos com isso? Então imaginem pessoas direta ou indiretamente ligadas à área da saúde, com rotinas corridas, afazeres, sem falar no trânsito paulistano... parando durante duas horas na semana para se dedicar a uma discussão que, como disse o Dr. José Luiz, não gera currículo ou pontos na carteira e nem sequer está relacionada à área de atuação delas. E o que leva uma instituição a investir em uma iniciativa como essa, que inclusive está aberta ao público externo? Bom, o ser humano tem dessas coisas, e quando falamos de humanismo, as coisas não precisam (e talvez não devam mesmo) ter uma utilidade prática, embora elas com certeza reverberem com muita força em nossas relações com as outras pessoas, com o mundo e com nós mesmos.
Porém, para não finalizar essa postagem de um jeito muito misterioso, trazemos abaixo uma manifestação da Ana Claudia Andreotti, analista de projetos do Infinis (braço da Fundação dedicado à filantropia e ao advocacy), que certo dia estava trabalhando quando apareceram algumas pessoas na sala dizendo que iria acontecer ali um encontro de humanidades. “Não acredito! Então vou ficar” foi a reação dela. E assim ela explica o motivo de ter não apenas ficado naquele dia como permanecido no grupo:
Uma das minhas coisas favoritas desse emprego é ter um grupo de filosofia no fim de expediente. É legal porque todas as áreas estão atuando com problemas super concretos, super imediatos e práticos, então é um momento de parar e refletir um pouco sobre questões mais profundas.
E se você gostou da ideia, saiba que pode participar! Basta entrar em contato com eventos@pensi.org.br.